Fissura anal: o que é e como tratar?

Introdução

A fissura anal é uma condição comum e muitas vezes subestimada, pelo fato de muitos pacientes não procurarem atendimento médico por medo ou vergonha, que afeta uma parcela significativa da população. Como coloproctologista com atuação em Belo Horizonte, é essencial que eu, Dr. Matheus Duarte Massahud, forneça uma compreensão abrangente dessa condição, incluindo suas causas, sintomas, diagnóstico e opções de tratamento.

Definição e características da fissura anal:

A fissura anal é uma pequena ruptura ou ferida na pele que reveste o canal anal, ou sejam um pequeno corte logo na transição da pele e mucosa (revestimento interno) do ânus. Como a região anal é possui uma rica invervação e, portanto, é muito sensível, as fissuras anais são muito dolorosas. Essa condição pode ocorrer em qualquer idade e é mais comum em adultos jovens do sexo masculino. Suas características clínicas incluem dor intensa durante e após a evacuação e sangramento anal. Outros sinais e sintomas como presença de excessos de pele (plicomas) e prurido (coceira) no ânus também podem estar presentes.

Fonte: Steele et al. The ASCRS Textbook of Colon and Rectal Surgery. 4th edition.

Causas da fissura anal:

As causas da fissura anal podem ser variadas, mas geralmente estão relacionadas a traumas na região anal. A constipação crônica (“intestino preguiçoso”), por exemplo, é um fator predisponente comum. Fezes duras e evacuações difíceis podem resultar em microtraumas repetitivos na mucosa anal, levando à formação da fissura.

Além disso, outros fatores que podem contribuir para o desenvolvimento da fissura anal incluem diarreia crônica, doenças inflamatórias intestinais, sexo anal passivo, gravidez e parto, bem como certas condições médicas que comprometem a irrigação sanguínea local como a hipertonia do esfíncter anal interno – mais frequente em homens jovens.

É importante lembrar que a localização da fissura diz muito sobre sua causa. Aquelas que não estão localizadas posterior (em direção ao cóccix) ou anterior (em direção ao períneo) devem acender um sinal de alarme para outras doenças como causa da fissura, conforme vemos na figura abaixo.

Fonte: IntechOpen.

Sinais e sintomas da fissura anal:

Os principais sinais e sintomas das fissuras anais são:

– Dor anal intensa: essa dor geralmente inicia quando as fezes passam pelo canal anal e inicialmente é percebida como uma sensação de corte no local. Muitas vezes a dor persiste por vários minutos até algumas horas após as evacuações, como uma sensação de queimação na região do ânus.

– Sangramento: o sangramento associado às fissuras anais é geralmente discreto, ou seja, em pequena quantidade, com sangue vermelho vivo que normalmente é visto no papel higiênico.

– Prurido (coceira): o prurido anal pode ocorrer em associação com a fissura anal. A coceira pode ser contínua ou ser associada ao momento das evacuações, iniciando-se logo após estas.

– Presença de plicomas: são excessos de pele na região anal e podem ser vistos em outras doenças do ânus, em especial na doença hemorroidária, ou em pós-operatórios de cirurgias anais.

Tipos de fissura anal

As fissuras anais se dividem em dois grupos, de acordo com a duração do quadro:

– Fissuras anais agudas: são aquelas com duração inferior a 6 semanas. Em mais de 90% dos casos, se for retirado o fator de trauma do ânus (ex.: fezes endurecidas, diarreia etc.), o quadro se resolverá sem necessidade de intervenções invasivas.

– Fissuras anais crônicas: são aquelas com duração superior a 6 semanas e muitas vezes associadas a papilas anais hipertróficas e a plicomas. Não possuem um resultado tão favorável sem intervenções cirúrgicas como as fissuras agudas. Muitas vezes estão associadas a hipertonia do esfíncter anal interno (um dos músculos responsáveis pela nossa continência fecal).

Diagnóstico da fissura anal:

O diagnóstico da fissura anal é geralmente clínico, baseado na história do paciente e nos sintomas apresentados. Exames físicos, como a inspeção da região anal, são frequentemente suficientes para confirmar o diagnóstico.

No entanto, em alguns casos, podem ser necessários exames complementares, como a colonoscopia, para descartar outras condições subjacentes, especialmente se houver suspeita de doenças inflamatórias intestinais ou câncer colorretal. Normalmente, a colonoscopia será solicitada naqueles pacientes que já tiverem mais de 40 anos ao procurarem atendimento médico ou que possuírem história familiar de câncer colorretal.

Tratamento conservador:

O tratamento inicial da fissura anal geralmente envolve abordagens conservadoras, destinadas a aliviar a dor, promover a cicatrização e prevenir a recorrência. Algumas dessas medidas incluem:

– Dieta rica em fibras: O aumento da ingestão de fibras alimentares pode deixar as fezes mais macias nos pacientes constipados ou formar um bolo fecal adequado naqueles com diarreia frequente, facilitando a evacuação e reduzindo o trauma na região anal.

– Hidratação adequada: Manter uma hidratação adequada é crucial para evitar a constipação e promover a saúde digestiva.

– Banho de assento: A imersão em água morna por cerca de 10 minutos algumas vezes ao dia pode aliviar a dor e promover a higiene local.

– Analgésicos tópicos: O uso de pomadas ou cremes contendo agentes anestésicos pode proporcionar alívio temporário da dor.

– Relaxantes do esfíncter anal interno: a aplicação local, na forma de cremes, de nitratos e bloqueadores dos canais de cálcio promove um relaxamento do esfíncter anal interno, melhorando a circulação sanguínea e favorecendo a cicatrização da fissura anal.

Tratamento cirúrgico:

Quando as medidas conservadoras não são eficazes, o tratamento cirúrgico deve ser considerado. Existem várias opções cirúrgicas disponíveis:

– Fissurectomia: é a remoção da fissura anal e fechamento primário do local, de forma que um tecido saudável promova a cicatrização do local cronicamente acometido.

– Fissurectomia com esfincterotomia lateral interna: é a fissurectomia associada ao corte parcial de fibras do músculo esfíncter anal interno na sua porção lateral com o objetivo de melhorar o fluxo sanguíneo na região onde havia fissura e evitar recorrências. Essa técnica deve ser empregada apenas em pacientes que possuem o tônus do esfíncter muito aumentado.

– Fissurectomia associada a injeção de toxina botulínica: realizamos a fissurectomia e injetamos a toxina para um relaxamento duradouro, porém temporário, do esfíncter anal interno, permitindo assim um melhor fluxo sanguíneo, melhor cicatrização e menos chance de recorrência da fissura.

Todas as técnicas são realizadas em bloco cirúrgico com sedação associada a outra modalidade de anestesia: local ou raquianestesia. Na maioria dos casos, o paciente é liberado no próprio dia da realização do procedimento.

Recuperação e Cuidados Pós-Operatórios:

Após a esfincterotomia ou qualquer outro procedimento cirúrgico, é crucial seguir as instruções pós-operatórias fornecidas pelo coloproctologista. Isso pode incluir repouso adequado, dieta específica, uso de analgésicos prescritos e evitar atividades que possam aumentar a pressão na região anal.

A recuperação completa pode levar semanas, durante as quais os sintomas devem melhorar progressivamente. O acompanhamento regular com o especialista é essencial para monitorar a cicatrização da fissura e abordar qualquer preocupação ou complicação potencial.

Prevenção da recorrência:

Prevenir a recorrência da fissura anal é uma parte crucial do cuidado a longo prazo. Algumas medidas preventivas incluem:

  • Manter uma dieta equilibrada: Uma dieta rica em fibras e hidratação adequada são fundamentais para manter um hábito intestinal saudável.
  • Evitar esforço excessivo durante a evacuação: Incentivar hábitos intestinais regulares e evitar a retenção prolongada das fezes.
  • Adotar práticas sexuais seguras: Para aqueles que praticam sexo anal, é importante fazê-lo de maneira segura e consensual, usando lubrificantes adequados.
  • Realizar exames regulares: Principalmente para aqueles com fatores de risco adicionais, como doenças inflamatórias intestinais ou histórico familiar de câncer colorretal.

Conclusão:

A abordagem da fissura anal requer uma compreensão abrangente das causas, sintomas, diagnóstico e opções de tratamento. A educação do paciente sobre medidas preventivas e o tratamento eficaz, seja conservador ou cirúrgico, são elementos essenciais para garantir uma recuperação completa e prevenir recorrências. A abordagem integral, incluindo dieta, cuidados locais e intervenções cirúrgicas, quando indicadas, desempenha um papel fundamental no gerenciamento bem-sucedido dessa condição muito frequente, mas muitas vezes subestimada. O Dr. Matheus Duarte Massahud possui vasta experiência no tratamento de pacientes com fissuras anais, tanto agudas quanto crônicas.

Fontes:

Fonte: Steele et al. The ASCRS Textbook of Colon and Rectal Surgery. 3rd edition.

Fonte: Steele et al. The ASCRS Textbook of Colon and Rectal Surgery. 4th edition.

– UpToDate

– IntechOpen

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